quarta-feira, 30 de julho de 2008

Assovia o vento

São novos tempos esses revoltos que sacondem nossos cabelos! É possível, com certo esforço dos esperançosos e crentes dos sorrisos dos meninos do samba "lapiano", sentir o vento fresco vindo dos cafundós das gargantas mornas em plenas gargalhadas. Ah. Ah! Tudo isso deve ser culpa do vento, como de costume, que vem passeando pelas nossas pernas como dedos ligeiros e espertos. Mas nada disso me impressiona. Esse vento vai ter que fazer muito para desviar meus olhos dos do alheio, tão doces e, arrisco, cheirosos - mesmo que isso não seja possível aos olhos dos mais burocráticos.
Então vamos adiante...
"... Dono de nada, dono de ninguém, nem mesmo dono de minhas certezas, sou minha cara contra o vento, a contravento, e sou o vento em minha cara."


p.s.:fico devendo um texto mais completo, mas é que esse blog está se tornando cada vez mais um lugar onde jogar emoções.

sexta-feira, 27 de junho de 2008

Next stop: my station

O metrô tem seus defeitos das 6 da tarde, mas o que eu mais gosto são as pessoas sentadas em fila, meio que sonhando com o nada, meio que pensando num sonho... Com seus óculos escuros, seus bonés escondendo os olhos e narizes, os cabelos desgrenhados e a falta de cabelos. Tudo isso durante o momento mais reflexivo, agridoce e esperançoso do dia.

quinta-feira, 12 de junho de 2008

Liga da Justiça... gramatical

Era mais um dia comum na Portuguelândia. A Mulher Gramática (manterei sua identidade em sigilo) passava uma tarde no parque com seu complemento nominal. Aproveitavam o dia ensolarado e o céu azul turquesa para transformar o ar fresco em palavras muito leves e em mesóclises muito queridas. Porém, tudo estava prestes a mudar. O Alerta Aurélio foi disparado denunciando que um crime terrível estava as portas de acontecer na cidade, e ela teve que partir. Era muito cruel para a Mulher Gramática deixar seu complemento nominal e se tornar intransitiva de forma tão cruel e desalmada. A Vida, substantivo próprio, nunca tinha de fato a pertencido; ela é que fazia parte da vida alheia sem que o mel de outros olhos fossem de fato seus, ou sem que ela pudesse também ser o complemento de alguém.

A emergência na cidade se tratava do grande vilão, o Dr. Inscrivinhante, que corrompia criancinhas loucas por açúcar para o uso errado de acentos e atirava proparoxítonas nos pais desesperados que tentavam se proteger com simples escudos pronominais. Vã tentativa, os erros de português do Dr. Inscrivinhante amarguraram as águas dos rios assim como o coração dos habitantes. A cidade tinha se tornado um depósito de cinzas negras de antigos corações amantes de regras que costumavam fazer das palavras sem nexo companheiras de ausências.

A Mulher Gramática se deu conta do momento ímpar pelo qual a cidade passava; e os problemas iam além de erros gramaticais. Falando e escrevendo com tantos erros, cada habitante acabava por criar uma língua própria e se afundando na solidão de universos particulares em forma de bolha. Nossa heroína finalmente se deu conta que o Dr. Inscrivinhante queria deixar esse mundo, vasto mundo, mudo. Sendo assim, ela se armou, respirou coragem, para que se espalhasse pelos pulmões e pelo sangue, e deu início a uma das maiores batalhas entre Perspicácia e Ignorância (duas gigantes, as armas da Mulher Gramática e do Dr. Inscrivinhante) jamais vista.

A briga foi árdua. Os pessimistas apostavam na força da Ignorância, em como ela era uma força primeira, onipresente, enquanto os otimistas, mesmo fundamentados na bravura da Perspicácia e em sua inteligência, tinham suas dúvidas quanto a vitória. Era de conhecimento geral que a Ignorância era complacente e tornava o mundo mais agradável para os que nela viviam, só não acreditavam, ou se recusavam a enxergar, que a inteligência ilhada por Ignorância de nada serve.

Mulher Gramática sentia-se fraca, com pernas de chumbo, cansada de travar uma luta pelos livros e para as palavras; desiludida. Nesse momento de descrença lhe veio à mente uma arma usada em poucas ocasiões, somente em momentos propícios e necessários de fato: o raio de Neologismo. Essa arma, inventada há séculos, era uma das maiores criações da Perspicácia e só em momentos ímpares, quando não existia nada mais para ser usado, o raio era a arma da vitória.

O Neologismo teve o resultado além do esperado. Dr. Inscrivinhante não resistiu ao seu próprio veneno, a invenção de palavras, misturada com a sagacidade que só a Perspicácia possui. Aos poucos as crianças voltaram à escola e a cidade foi reconstruída. Os complementos, tanto verbais quanto nominais, voltaram aos seus lugares de direito, os acentos fugitivos estavam outra vez na Prisão dos Colchetes e Parênteses e até as aspas puderam voltar a cumprir o papel designado pelos “homens do poder”. A vida voltava ao normal, até a Mulher Gramática e seu complemento nominal passaram a virar uma locução adjetiva para, depois de algumas borboletas amarelas, virarem um singelo e açucarado adjetivo.

E o mundo do português estava a salvo mais uma vez!

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Molico way of life??

O efêmero é especial, singular, brilhante, doce e raro, obviamente. E é para que assim continue ou então seria da mesma beleza que um “bom dia”; a rotina é inimiga mortal da efemeridade. Se o comum vira raro e vice versa, os conceitos se trocam totalmente, mas ainda continuam a dizer a mesma coisa. A grande questão e raridade da efemeridade se localizam em tornar encontros quase diários (e doces demais para que não sejam rotina) tenham a mesma beleza, e brilho, e frescor que a efemeridade possui, só que sem perdê-la no final de cada dia. É possível prolongar o gosto que o efêmero deixa na boca por todo um dia? Até que ponto é crível, sendo vítima, prendê-lo para que não saia pelos poros e que não reflita pureza nos dentes? É plausível engoli-lo e fazer uma antropofagia de quem proporciona condição do efêmero para não perdê-lo mais? Para a última questão, pelo menos, a resposta afirmativa me parece provável.

É como uma assimilação da pessoa menos que do sentimento em si. É guardá-lo numa caixinha lilás no canto da estante para que não vá embora e, assim, tornar a sensação que lhe foi causada como própria, até porque aconteceu com e em você. Aquilo passa a ser parte sua e algo que ajuda a te definir.

Mas essa antropofagia sentimental (ou não) beira o perigo instantâneo e inegável. O amor pela aventura vai sempre existir, assim como a necessidade da segurança. Ao mesmo tempo em que nos jogamos no mundo, ao mundo, acabamos por optar muitas vezes pelo esconderijo, só que o efêmero não vem para quem vive enfiado num buraco escuro e fétido cavado pelo medo. Joguem suas caras ao vento, sejam o vento em suas caras. Mesmo que eu assim não aja, é o que eu gostaria de fazer e continuo trabalhando por. Quando o efêmero vira parte de nós e passa, assim, a estar em qualquer lugar que você esteja (porque é você mesmo) o efêmero vira o mundo e o vento e é ele que meneia as saias com os dedos doces e cheios de idéias. Não se tem mais como ou porque fugir.

quinta-feira, 5 de junho de 2008

"Põe no cabelo uma estrela e um véu e diz que caiu do céu."

Ela era bailarina, já cansaram de afirmar; fazia o possível para continuar dançando mesmo que o público muitas vezes não se desse conta do espetáculo. Dessas princesas sem coroa que flutuam como pluma dourada sobre um chão de cristal. As sapatilhas eram coloridas com vidrilhos azuis e cheiravam a flor carmesim, dançava e os brincos faziam tlin-tlin. A bailarina vivia a rodar, fazia o mundo girar mais rápido e trazia o tempo entre os pés. Tempo esse que acreditava ser a dona até que; até.

Chegou ele. Ele. Com as flores entre os dedos cheirando a violetas, chapéu na mão e roupas com perfume de jasmim. Sem ação, a bailarina se perdeu, parou de girar, perdeu o controle do tempo, tamanho era o peso do coração que trasbordou todo aquele sentimento sem nome, aquele que ocupava todo o espaço, e lhe caiu nos tornozelos fazendo com que dançar não fosse mais possível. O que seria de uma bailarina que não pode dançar? Mas o amor tem dessas coisas, de nos grudar na terra, pisotear-nos enquanto nos beija com lábios de caramelo.

Com toda essa ternura por todos os cantos, com as pernas, braços e pontinha do nariz dormente, a bailarina não acreditou que o peso do amor às vezes fortalece as pernas e acelera o coração ao invés de quase fazê-lo parar. Ou vai ver faz com que pare de fato e tudo fique estático só com olhares. Não era ela, afinal, quem estava dormente, era o mundo que entrou numa dormência por causa de todos os sentidos, pelos olhos que o amor pede, pelos ouvidos que ele demanda, pelo tato inerente, pelo perfume sem explicações e pelo gosto açucarado de felicidade esperada.

Pois bem, a bailarina voltou a dançar, com jasmins esfolhados sobre os pés flutuantes, sapatilhas manchadas de flor carmesim e aqueles brincos fazendo tlin-tlin. O coração era música, e ela olhava para o mundo gigantesco guardado no cantinho do peito de flor em botão.